terça-feira, 22 de novembro de 2016

God Bless America

Feriado em Niterói, dia de Araribóia ou será aniversário do André Marques? Sei lá, feriado obscuro para justificar a vagabundagem na cidade sorriso. Tô trabalhando, porque me recusei a festejar o dia da retirada do prepúcio do Jorge Roberto Silveira. Mas... a minha fiel escudeira Tereza festeja e por isso, fiquei sem o meu feijão com couve e angu. E vamos de Santa Ceia, lugar de comida tumultuada e gororoba bate-entope.
Encontrei lá com o meu amigo Zé José, com quem dividi mesa. E não é que o onomatopeico servivente ficou indignado porque tirei uma pequena semana de ócio na terra de Pocahontas e não postei nenhuma foto, nenhum vídeo e nenhum mísero "check in" no Facebook!!!! Concluí, que viajar sem Facebook é como gargalhar em enterro. Uma enorme falta de educação. Afinal, o que vale gastar em dólares, viajando para os domínios de Donald Trump (ou outro canto qualquer do planeta) se você não vai ostentar isso em rede social. Me lembrei de alguns que viajam somente para postar o máximo possível das suas viagens. Se forem perguntados para onde foram, periga não saberem, pois estavam ocupados em postar alguma coisa.
Mas gostei bastante de vagabundear pelas roças americanas. Agradeci muito a Deus por passar longe das Mecas terceiromundistas de Noviorque e Maiami. Nada de luz piscando, neon frenético, nada de hordas de chineses, japoneses e mineiros saindo pelos ralos e bocas de lobo. Nada de comida no Carnime's e Olive Garden (o Santa Ceia dá de 10). A parada foi em Georgetown, bairro de Washington que lembra um Cosme Velho sem morro e limpinho. Fui também pra Charlottesville, bucólica cidadezinha do sertão redneck com suas 300 vinícolas e 200 cervejarias. Fiquei nas cervejarias e o meu fígado, não obstante a ralação, resistiu bravamente.
Agora, o que me causou uma enorme insatisfação e indignação foi que na terra do Tio Sam não existe ducha higiênica. Como assim? Não tem!!! Se você é um sujeito asseado como eu e que preza o buzanfã cheiroso, terá poucas opções de se manter limpinho. Ou você segura o Mandela até na hora de tomar um banho ou passa numa Walgreens e compra um lencinho umedecido de limpar fiofó de neném. A nossa lavadinha básica depois daquele churro recheado fica muito prejudicada. Como pode a America, "home of the free and land of the brave", ser formada por bundas sujas, assadas e crivadas de grafunchos? Como meu Deus? Já até pensei num modelo de negócio pra instalar duchas higiênicas em hotéis, bares e lares lá na terra da Melania (a gostosa primeira dama, made in Paraguai). Fiquei num 5 estrelas que além de não ter ducha higiênica, não tinha também glass shower (box de vidro). Era aquela mixórdia de banheira com cortinha, que tinha igual na casa da minha vovó Bel em Moeda - MG.
Há sobre o Trump! Conselho de mineiro: se voce viajar para aquelas bandas, não critique, não questione e não duvide do sábio líder eleito pelos rednecks. Você será devidamente esculhambado e xingado de elite, coxinha, reaça, entreguistas e outros impropérios ouvidos recentemente aqui em Pindorama. Aliás eu fiquei pasmo de como a fé dos rednecks no Trump é parecida com a fé dos crentes em Lula. Ambos são os salvadores da pátria, que preservarão o emprego da patuleia, que olharão pelos mais pobres, protegerão a industria nacional, enfrentarão o inimigo externo e outras bobagens populistas. God bless America.

terça-feira, 3 de março de 2009

Relacionamentos

Esse texto aí embaixo é bem legal, não fui eu quem escreveu, e não sei quem foi. Quando lí era creditado ao Arnaldo Jabor, mas como tudo que foi escrito na internet ou é do Jabor ou do Veríssimo ou da Martha Medeiros, eu desconfio sempre da autoria. Vai lá então:
-
"Sempre acho que namoro, casamento, romance, tem começo, meio e fim. Como tudo na vida. Detesto quando escuto aquela conversa:
- Ah, terminei o namoro...
- Nossa, estavam juntos há tanto tempo...Cinco anos...que pena ...acabou....
- É...não deu certo...
Claro que deu! Deu certo durante cinco anos, só que acabou. E o bom da vida, é que você pode ter vários amores. Não acredito em pessoas que se complementam. Acredito em pessoas que se somam. Às vezes você não consegue nem dar cem por cento de você pra você mesmo, como cobrar cem por cento do outro? E não temos essa coisa completa.
Às vezes ela é fiel, mas é devagar na cama.
Às vezes ele é carinhoso, mas não é fiel.
Às vezes ele é atencioso, mas não é trabalhador.
Às vezes ela é muito bonita, mas não é sensível.
Tudo junto não vamos encontrar. Perceba qual o aspecto mais importante para você e invista nele. Acho que o beijo é importante...e se o beijo bate...se joga...se não bate ...mais um Martini, por favor...e vá dar uma volta. Se ele ou ela não te quer mais, não force a barra. O outro tem o direito de não te querer. Não brigue, não ligue, não dê "pití". Se a pessoa tá com dúvidas, problema dela, cabe a você esperar.... ou não. Existe gente que precisa da Ausência para querer a Presença. O ser humano não é absoluto. Ele titubeia, tem dúvidas e medos, mas se a pessoa Realmente gostar, ela volta. Nada de drama. Que graça tem alguém do seu lado sob pressão? O legal é alguém que está com você, só por você. E vice versa. Não fique com alguém por pena. Ou por medo da solidão. Nascemos sós. Morremos sós. Nosso pensamento é nosso, não é compartilhado. E quando você acorda, a primeira impressão é sempre sua, seu olhar, seu pensamento. Tem gente que pula de um romance para o outro. Que medo é este de se ver só, na sua própria companhia? GOSTAR DÓI. Muitas vezes você vai sentir raiva, ciúme, ódio, frustração..... Faz parte. Você convive com outro ser, um outro mundo, um outro universo. E nem sempre as coisas são como você gostaria que fosse.... A pior coisa é gente que tem medo de se envolver. Se alguém vier com este papo, corra, afinal você não é terapeuta. Se não quer se envolver, namore uma planta. É mais previsível. Na vida e no amor, não temos garantias. Nem toda pessoa que te convida para sair é para casar. Nem todo beijo é para romancear. E nem todo sexo bom é para descartar... Ou se apaixonar... Ou se culpar... Enfim...quem disse que ser adulto é fácil ?????"

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

O Penis e a Tartaruga

Hora do banheiro é tempo de esquecer a barafunda do mundo exterior e deixar a cabeça voar em “devaneios loucos” como diria o feioso Zé Ramalho da Paraíba. Quem tem filho sabe o que estou falando. A gente chega em casa e é:
- Paiiiêêê – berra a filha
- Paiiiêêê – ruge um filho
- Paiiiêêê – se esgoela outro filho
Nessa hora invejo quem tem menos filho do que eu. Mas no meu remanso do trono sanitário, lendo aquela revista Veja velha estrategicamente decorando a bancada da pia - estrategicamente porque na hora em que o Jarbas não está em casa e não adianta a gente gritar “Neve”, aí a amiga Veja pode ser perfeitamente depenada como um frango abatido, e ter um uso diverso do que imaginou Victor Civita ao fundar a mais anti-lulista das revistas – então, folheando a revista, leio sobre uma insana americana, clone da Angelina Jolie, que teve óctuplos, e antes deles tinha outros seis em casa. Amigos, são 14 filhos. Imagina só essa alcatéia de pimpolhos gritando Paiiiêêê. Enlouquecedor. Nessa hora aceitei de bom grado a minha sina de pai de trigêmeos.

Voltando ao banheiro, ou melhor, sem sair de lá, fiz daquele santo recinto o meu lugar de refúgio, meu abrigo nuclear, meu bunker. Porta trancada, ali faço a minha terapia diária, esqueço o mundo e me permito teorizar sobre o sentido da vida e outras bobagens. Ali entro, nem sempre para fazer as necessidades básicas, mas principalmente para economizar psiquiatra.

Dia desses, estava lá, peladão, temperando a água do chuveiro (ganhar o premio Nobel é mais fácil), e não sei porque, dei de cara com o meu pênis. Foi esquisito, pois dessa vez eu não vi o pênis como aquele velho companheiro de jornadas paradisíacas ou bizarras, freqüentador de lugares encantadores e também insalubres. Vi desta vez, aquele pedaço de carne, como se fosse eu um ET sendo apresentado a um ornitorrinco. Nesta hora eu entendi o Eduardo, meu filho, quando um dia me vendo trocar de roupa olhou para o meu pênis e disse:
- Nossa, parece um papagaio!
Não que ele pareça um papagaio. No mundo peniano seria considerado um belo representante da espécie, quase sempre rijo e asseado. Mas para o Eduardo, na ausência de hormônios que empalidecem o senso estético, aquilo devia mesmo parecer uma ave psitacídea. O que me espantou, é que noves fora a evolução da espécie humana que tornou aquele apêndice atrativo ao sexo oposto, temos que adimitir, aquilo é feio pacas.

Foi aí que fiquei encantado com a perfeição da natureza. Como é que aquela tripa quase sempre muxibenta, não só a minha mas a de todos os outros machos do planeta, pode ser atrativa para o belo e sensível sexo feminino? Como é que elas, tão lindinhas e cheirosas, podem gostar de por aquilo na boca, serem penetradas por aquela minhoca rígida? Foi aí que eu me dei conta que mais feio que o pênis, só mesmo a vagina. Não é à toa que também é chamada de "perereca". Esteticamente falando, a “perereca” é tão horrível quanto a sua homonima prima , a rã. Ou alguém aí acha o marisco o suprassumo da obra divina? A vagina, somente ela e não o entorno, não passa de um mega marisco. Até no cheiro eles se equivalem.

Antes que as meninas que lêem essa divagação psicodélica reclamem, e me chamem de nojento, aqui não venho para distratá-las, até mesmo porque sou apreciador daquele “marisco”. Sou produto de milênios de evolução. Daria um belo material de estudos para o centenário Darwin. Venero aquela parte da anatomia feminina. Gosto de ver, cheirar, introduzir, beijar. Será que existe algo mais emocionante e prazeroso que o contato da sua língua com a vagina da mulher que você deseja, ou da amiga que permite que você a conheça melhor, e não veja aquilo somente como uma tara vagabunda? Atenção, isso aqui não é um conto erótico, mas apenas a compreensão de como é poderoso o instinto impregnado em nosso DNA. Como é que dois órgãos tão horrendos podem ser tão atrativos ao sexo oposto?

Foi aí que me vi matutando sobre a tartaruga. Deus foi especialmente infeliz quando criou a tartaruga. Será que habita no planeta terra algum ser mais pavoroso do que a tartaruga? Talvez a galinha. Se ela fosse uma fruta, seria um mamão ou uma jaca. A tartaruga é um quelônio, e é prima dos cágados e jabutis. Entenderam? Até a escolha dos nomes é bizarra. Entretanto lá está ela, a tartaruga, mais feia que mudança de pobre, se reproduzindo aos milhares. Como é meu Deus que uma tartaruga pode ter tesão por outra tartaruga? Você já foi no jardim zoológico e viu aquela pilha de tartarugas transando. Além de horríveis, elas são promíscuas e adoram uma suruba. E a vagina da tartaruga? Acho melhor deixar de lados os detalhes escatológicos.

Entenderam agora onde eu queria chegar? Imagine que o seu pinto ou sua perereca fosse uma tartaruga. Seria o final da espécie humana. Não dá pra abstrair, não dá pra imaginar, a natureza é implacável. Será que a tartaruga pensa o mesmo? Acho que devo voltar ao zoológico e mostrar o pinto para alguma tartaruga. Será que corro o risco de alguma delas vomitar?
- Paiiiêêê, sai do banheiro – esmurram a porta meus trigêmeos
Paro de olhar para o meu pinto. Enfio ele dentro da cueca e saio dali. Ainda bem que não nasci tartaruga.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Essa eu queria ter escrito

"Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural, com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. E o artigo era bem definido, feminino, singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal. Era ingênua, silábica, um pouco átona, até ao contrário dele, um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanáticos por leituras e filmes ortográficos.

O substantivo gostou dessa situação, os dois sozinhos, num lugar sem ninguém ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade, começou a se insinuar, a perguntar, a conversar. O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse pequeno índice. De repente, o elevador para, só com os dois lá dentro, ótimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeça a se movimentar, só que em vez de descer, sobe e para justamente no andar do substantivo. Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela em seu aposto. Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, bem suave e gostosa. Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando, sentados num vocativo, quando ele começou outra vez a se insinuar. Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto. Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário, e ele sentindo seu ditongo crescente, se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples passaria entre os dois. Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula ele não perdeu o ritmo e sugeriu uma ou outra soletrada em seu apóstrofo. É claro que ela se deixou levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros. Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa. Entre beijos, carícias, parônimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais, ficaram uns minutos nessa próclise, e ele, com todo o seu predicativo do objeto, ia tomando conta. Estavam na posição de primeira e segunda pessoa do singular, ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular.


Nisso a porta abriu repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo, e entrou dando conjunções e adjetivos nos dois, que se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o seu particípio na história. Os dois se olharam, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou, emostrou o seu adjunto adnominal. Que loucura, minha gente. Aquilo não era nem comparativo, era um superlativo absoluto. Foi se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos. Foi chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo, propondo claramente uma mesóclise-a-trois. Só que as condições eram estas, enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino. O substantivo, vendo que poderia se transformar num artigo indefinido depois dessa, pensando em seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história. Agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva".


Esse texto eu queria ter escrito, mas foi feito por uma aluna docurso de Letras, da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco -Recife), que venceu um concurso interno promovido pelo professor titular da cadeira de Gramática Portuguesa.

terça-feira, 25 de março de 2008

É Proibido

- Por Pablo Neruda -

É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.

É proibido não rir dos problemas
Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,

Não transformar sonhos em realidade.
É proibido não demonstrar amor
Fazer com que alguém pague por tuas dúvidas e mau-humor.
É proibido deixar os amigos

Não tentar compreender o que viveram juntos
Chamá-los somente quando necessita deles.
É proibido não ser você mesmo diante das pessoas,
Fingir que elas não te importam,

Ser gentil só para que se lembrem de você,
Esquecer aqueles que gostam de você.
É proibido não fazer as coisas por si mesmo,
Não crer em Deus e fazer seu destino,

Ter medo da vida e de seus compromissos,
Não viver cada dia como se fosse um último suspiro.
É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,

Esquecer seus olhos, seu sorriso, só porque seus caminhos se desencontraram,
Esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.
É proibido não tentar compreender as pessoas,
Pensar que as vidas deles valem mais que a sua,

Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte.
É proibido não criar sua história,
Deixar de dar graças a Deus por sua vida,

Não ter um momento para quem necessita de você,
Não compreender que o que a vida te dá, também te tira.
É proibido não buscar a felicidade,

Não viver sua vida com uma atitude positiva,
Não pensar que podemos ser melhores,
Não sentir que sem você este mundo não seria igual.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Deliverance

Essa não deu mesmo para resistir. Isso é do tempo em que comecei a gostar de filmes e música. Não necessariamente musicais, que eu também gosto muito, mas aquela coisa de uma música inserida dentro de um filme e que fica para sempre na cabeça da gente. Ou alguém se esquece do Darth Vader entrando no cenário e aquela música retumbante atrás, ou a Interprise cruzando o espaço, a fronteira final, com o Capitão Kirk narrando ao fundo, ou mesmo o Paul Newman carregando a Katharine Ross na bicicleta e ao fundo... "raindrops keep falling on my head". Inesquecíveis. Essas trilhas sonoras vão perdurar para sempre na minha cabeça. Então ai está uma das minha prediletas. Dueling Banjos do filme Deliverance.

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Vovózinha

Essa história é verdadeira, mas para evitar problemas com os protagonistas, todos os nomes foram trocados. Contudo é uma história que merece ser contada.

Juvenal era trabalhador. Iniciou sua vida profissional como técnico em edificações, e depois com muita dificuldade conseguiu entrar para uma faculdade de arquitetura, se formar, trabalhar em uma multinacional e finalmente montar o seu próprio escritório. Trabalhava com afinco, estava cedo diante da prancheta, e mais tarde do computador, criando espaços e projetando construções elogiadas por seu arrojo e criatividade. Enfim, um sucesso. E com ele, reconhecimento e uma vida confortável.

Contudo Juvenal, que já tinha passado dos 30, nunca tinha solucionado sua vida amorosa. Era demasiadamente tímido. Não conseguia transpor a barreira da gagueira, da falta de assunto, das mãos molhadas e do pé frio, toda a vez que ficava diante de algum objeto de seu desejo, ou seja, mulher. Os amigos tentavam ajudar sem sucesso. Quando fez 30 anos, seu pai chamou-o para uma conversa séria, pois pegava mal um cara daquela idade, arquiteto, nunca ter tido uma namorada antes. Desconfiavam de sua sexualidade. Coitado de Juvenal, ele não era gay, era tímido.

Um dia apareceu Jandira. Menina muito bonita, olhos verdes, cabelos castanhos, sorriso perfeito, inteligente, e...tímida. O coração de Juvenal pulou quando foram apresentados. Em um esforço hercúleo consegui superar os tremores e suores, e engatar uma conversa com Jandira. Bom, não foi bem uma conversa, foi mais um apanhado de interjeições monossilábicas. Mas a coisa deu certo, namoraram e pouco tempo depois decidiram se casar.

Mas um problema Juvenal deveria superar. Desde criança, ele nunca deixou de fazer xixi na cama. Escondia esse hábito das pessoas. Dormia de fralda geriatrica. Um plástico recobria o seu colchão. Era um problemão que só aumentava na medida em que o seu casamento com Jandira se aproximava. Ele temia a reação da sua noiva quando descobrisse ser ele um mijão. Os dias passavam, a data fatídica se aproximava. Então, Juvenal resolveu superar seus medos e procurar um psicólogo. No dia da consulta ele suava mais que tampa de chaleira. Mas rumou com uma coragem surpreendente para o consultório do Dr. Aderbal, um renomado terapeuta. Aquele problema tinha de ser solucionado.

Dr. Aderbal fora muito bem recomendado, e tranquilizou Juvenal no minuto seguinte à sua entrada no consultório. Pediu que ele descrevesse o seu problema.
- Dr., não sou mais um garoto, mas não me livro de um antigo hábito. Todas a noites faço xixi na cama - disse Juvenal, mais gago que nunca.
- Mas Juvenal, quando voce dorme, com o que voce sonha?
- Todas as noites sonho com a minha vovozinha! Ela me coloca na cama, me dá leite e pergunta se eu já fiz xixi.
Dr. Aderbal, profissional sagaz e experiente, vislumbrou a solução para o problema que atormentava Juvenal.
- Juvenal - disse o médico - de hoje em diante, quando a sua vovozinha surgir no seu sonho e perguntar se voce já fez xixi, voce diz para ela que sim e pergunta se ela também já fez.

Dito e feito. Logo na primeira noite de sono, quando a vovozinha de Juvenal aperece e pergunta pelo xixi, ele responde que já fez e indaga se ela já tinha feito também. Nunca mais a vovozinha apareceu em outro sonho. Juvenal estava pronto para o matrimônio.

O casório foi animado, a festa bonita, e Jandira estava deslumbrante. A única ansiedade de Juvenal agora era que aquela festa terminasse logo para que ele pudesse desfrutar dos encantos de Jandira.

A noite de núpcias foi fantástica. Jandira se revelou. Era tímida no trato com as pessoas, mas uma messalina na cama. Juvenal também correspondeu a altura. Ele estava realizado e feliz. A noite foi de sexo selvagem, mas também de muito carinho. Então exaustos adormeceram o sono dos justos. Um nos braços do outro. E, Juvenal sonhou...

- Juvenal, você já fez o xixi - perguntou a vovozinha no sonho.
- Já fiz vovó. E a senhora, já fez o seu xixi?
- Também já fiz Juvenal - respondeu a vovó - E o cocô, você já fez?

No dia seguinte Jandira pediu a anulação do casamento.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Juno

Assisti hoje o filme Juno. Sensacional. O filme é de uma delicadeza e otimismo de amolecer o coração do mais empedernido macho. Lembra muito na sutileza um filme de 2007, também emocionante, Pequena Miss Sunshine. A atriz que interpreta Juno é Ellen Page. Ela dá um banho naquela mistura de menina descolada e maluquete. Ela é lindinha e dá vontade de levar para casa. Estou aqui assistindo a entrega do Oscar na esperança que ela abiscoite o prêmio. Também o ator Michael Cera, que faz o namoradinho de Juno, deveria ser premiado pela cara de pateta que consegue fazer, e passar mais carinho que pena. Outro ótimo ator no filme é J.K. Simmons, que faz o pai de Juno. Não percam. É daqueles filmes onde a gente sai do cinema mais leve e com a alma lavada.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Mulheres Diet

Um estudo feito por médicos americanos da Universidade de Pardue e publicado na revista Behavioral Neuroscience, chegou à conclusão que os alimentos diet aumentam em 34% os riscos de síndrome metabólica, ou seja, engordam mais do que o velho e bom açúcar. Acho estranho esses cientistas americanos com suas verbas milionárias pesquisando o óbvio ululante. Seria muito mais barato se tivessem pegado o telefone, ligado para o Brasil, e me perguntado, pois isso eu já sabia há muito. É só prestar atenção para descobrir que em sua maioria, os comedores de diet são invariavelmente cheinhos, gordos ou obesos. Magros gostam mesmo é de açúcar, carboidrato, gorduras e outras coisas engordativas.

Os pesquisadores americanos deveriam ocupar os seus neurônios com um assunto muito mais digno de pesquisa. Por exemplo, uma mutação genética importantíssima que vem substituindo as mulheres normais e colocando em seu lugar clones. Esses novos mutantes são na verdade mortos-vivos, quimeras, que vagam pelas nossas cidades sem darmos conta que esses seres não são mulheres. Se parecem com mulheres, se vestem com mulheres, são portadoras de seios e vagina, mas são outra coisa. São Mulheres Diet. Elas se caracterizam pelo vazio. São ocas, de inteligência anoréxica, de imaginação esquálida, de presença esquelética, de humor raquítico, de sentimentos cadavéricos.

Exite um filme da década de 50 chamado “Invasores de Corpos”, no original Invasion of the Body Snatchers, em que os habitantes de uma pacata cidade americana, são substituídos por clones malignos e sem sentimentos. Tudo isso urdido por uma inteligência alienígena. Talvez hoje esteja acontecendo o mesmo. Mulheres verdadeiras sendo substituídas pelas Diet, e por traz disso duas inteligências alienígenas. A mídia e a moda. A versão masculina desta síndrome também já alcança proporções epidêmicas. O Homem Porra. Aquele que vem ao mundo simplesmente para espalhar o seu sêmen, e assim multiplicar as suas características genéticas. Quando não está espalhando o sêmen, está malhando, vagabundando, fumando unzinho ou indo a um show de axé para pegar alguma mulher diet para perpetuar o ciclo.

As Mulheres Diet e os Homens Porra, caracterizam-se pela preocupação obsessiva/compulsiva com as futilidades da vida, e pelo vasto vocabulário formado pelo inimaginável número de 17 palavras. Os gênios dessa raça conseguem pronunciar 18 palavras, cinco vocábulos e duas interjeições, sendo que dessas, as mais pronunciadas são, uhuuu, caraca, peguei e comi.

Mulheres, vocês de carne, osso e massa cinzenta, estão em perigo. Não se deixem abduzir e serem substituídas por clones. Resistam a tentação. Nós, homens de verdade, aqueles que vocês tanto procuram e nunca conseguem encontrar, aqueles que gostam de apreciar e não usar as mulheres, gostamos mesmo é das mulheres gordas. Não necessariamente na estética, se bem que isso pouco importa. Mas queremos cérebro gordo, recheado por idéias obesas e inteligência rotunda. Queremos que vocês sejam sobrudas na parceria, adiposas na cumplicidade, lipídicas no carinho, sobervaldas na simpatia, redondas no humor. Garanto que serão correspondidas com obesos mórbidos, exatamente como queremos que vocês sejam.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

FImDELinha

Em 1980 entrei para a faculdade. Curso escolhido, acho que por vocação, Arquitetura. Meu pai apoiou, mas, com aquela ponta de frustração. Ele preferia que seu primogênito fosse advogado ou médico. Arquiteto era coisa de comunista e viado. Paciência, eu com certeza se eu fosse advogado perderia todas as causas. Pior se fosse médico, já teria o meu registro cassado por barbeiragem. Virei arquiteto, não o melhor, mas certamente acima da média. Olha que admitir isso (ser “apenas” acima da média) é reconhecer um fracasso, pois todos os arquitetos se acham gênios da raça, criaturas de incrível bom gosto, descolados, modernos e únicos.

Para a tranqüilidade do meu velho, a pederastia nunca foi uma opção. O mesmo não podia falar do comunismo. No auge da minha inocente juventude, aquela coisa da igualdade entre os homens, do combate à “exploração do homem pelo homem”, aquelas figuras emblemáticas, onde se destacavam dois grandes arquitetos, um grande pela própria arquitetura, Oscar Niemeyer, e o outro pela música, Chico Buarque, era uma fascinação para aquele garoto no início da universidade. Aliás todos lá eram comunistas. Era cafona não ser. Ficava difícil até “pegar” uma mulherzinha. Até uma indefectível barbicha eu tentei cultivar, mas era imberbe demais e fiquei com a cara do Chico Bento. Desisti logo pelo ridículo.

Com o tempo, aquele povo começou a me parecer chato demais, sem proposta nenhuma, com a idéia fixa de paralisar a faculdade com greves idiotas. Já fiz greve e passeata para protestar contra o absurdo do preço cobrado pelo bandeijão da faculdade, que hoje seria R$ 1,00!!! Naquela época nunca ouvira falar de Milton Friedman, e que não existia almoço grátis. O ídolo daquele povo era o Fidel, e o mártir Che Guevara. A mitologia daquele barbudo descendo Serra Maestra para derrubar o títere do imperialismo Fulgêncio Batista, fazia os vermelhos da USU imaginar um outro barbudo, talvez o Lula ou o Dirceu, descendo a Serra das Araras e pendurando no poste o Roberto Marinho ou a Carmem Mayrink Veiga. Para mim foi uma época de ingenuidade. Hoje, pensando naquele tempo, me vem à cabeça uma citação de Nelson Rodrigues: “Jovens, envelheçam antes que seja tarde”.

Hoje o ditador Fidel renunciou. O regime opressor que ele implantou em Cuba continua, mas vale o simbolismo. Foi-se o último dos “porcos”, conforme George Orwell. Foi tarde. É indiscutível que ele derrubou na década de 60 um ditador sanguinário, que manteve o povo cubano ao largo de alguma condição humana. É indiscutível também que ele se transformou na criatura que derrubou, não obstante ter tornado a sociedade cubana igualitária. Todos se igualam. Tal como uma fazenda escravocrata do século 19, todos os escravos cubanos tem educação igual, saúde igual, todos comem igualmente pouco, trabalham igualmente para Fidel sem remuneração digna, todos tem o direito de não ter bens, todos têm o igual direito de ir e vir, desde que dentro da fazenda cubana, desde que respeitem o feitor, todos têm direito de idolatrar Fidel, sem contestações. Caso contrário, ao pelourinho. Mas saúdo o povo cubano. Pelo menos em uma coisa a vida deles melhora. Ficaram livres dos discursos intermináveis e soporíferos. Aos saudosistas da verborragia restará o venezuelano Chaves.

Entretanto, continua para mim um mistério ser Fidel ainda admirado por figuras esclarecidas e cultas da nossa raça tupiniquim. Serei eu um vendido ao império americano que não consigo enxergar suas qualidades ? Será que vendi a alma para o demo? Acredito no direito de ir e vir. De ser remunerado pelo mérito. De poder escolher o meu governante, mesmo que essa escolha desande em Lula, Maluf, Sarney ou Garotinho. Acredito no poder da escolha, de falar e escrever o que eu penso, sem a preocupação de ser penalizado por minhas crenças, sejam elas certas ou erradas. Tenho absoluta certeza que tudo que escrevi acima seria censurado em Cuba. Se eu fosse um cubano, dormiria no mínimo preocupado por uma possível retaliação, ou talvez não tivesse a coragem de publicar o escrito aqui. É esse o encanto que fascina os Niemeyers e Chicos da vida?

Já vai tarde Fidel!

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Céu Azul


Passei algum tempo sorumbático. De vez em quando, ficar sozinho é duro. Ter alguém por perto, mesmo que não se tenha muito assunto para trocar, é reconfortante. Alguém que você goste, um amigo, um irmão, um amor. Ver um filme junto, comer miojo, tomar um chopp, conversar fiado, ver estrelas. Mas aprendi que eu sou a minha melhor companhia. E fico feliz por estar bem acompanhado de mim mesmo. Mas para chegar lá neste encontro de mim com eu, há de se percorrer um caminho comprido. E para desfrutar plenamente desta melhor e singular companhia é imprescindível pensar para frente, ter coragem e ter certeza que ela está lá, te esperando e que vai ser sua. "Não importa o que o passado fez de mim. Importa é o que farei com o que o passado fez de mim".

Por isso mesmo, estou postando uma música que se encaixa com perfeição neste momento.


Jimmy Cliff - I Can See Clearly Now

I can see clearly now the rain is gone.
I can see all obstacles in my way.
Gone are the dark clouds that made me blind.
It's gonna be a bright (bright) bright (bright) sunshiny day.
It's gonna be a bright (bright) bright (bright) sunshine day.

Oh yes, I can make it now the pain is gone.
All of the bad feelings have disappeared.
Here is the rainbow I've been praying for.
It's gonna be a bright (bright) bright (bright) sunshine day.
It's gonna be a bright (bright) bright (bright) sunshine day.

Look all around, there's nothing but blue skies.
Look straight ahead, there's nothing but blue skies.

I can see clearly now the rain is gone.
I can see all obstacles in my way
Here is the rainbow I've been praying for.
It's gonna be a bright (bright) bright (bright) sunshine day.
It's gonna be a bright (bright) bright (bright) sunshine day.
______________________________________________

Posso ver claramente agora que a chuva se foi
Consigo ver todos os obstáculos em meu caminho
As nuvens negras que me cegavam foram embora
Será um brilhante dia de sol
Será um brilhante dia de sol
Agora sim...a dor foi embora
Todos os sentimentos ruins desapareceram
Aqui está o arco-iris pelo qual tenho rezado
Será um brilhante dia de sol
Será um brilhante dia de sol

Olhe à sua volta....não há nada além do céu azul
Olhe em frente, não há nada além do céu azul

Posso ver claramente agora que a chuva se foi
Consigo ver todos os obstáculos em meu caminho
Aqui está o arco-iris pelo qual tenho rezado
Será um brilhante dia de sol!
Será um brilhante dia de sol

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Urinol


A postagem anterior ele foi muito citado, por isso, me penalizando pela criticas anteriormente produzidas, venho me retratar com essa belíssima peça, agora em desuso, que por muitas gerações aliviou o desconforto de nossos ascendentes. Por isso aí vai o poema de Manuel de Freitas.

URINOL

As melhores horas da nossa vida,
as mais contentes, passámo-las
num urinol qualquer,
vendo correr o mijo
capaz e fluente numa certeza de louça
branca, amarela ou cinzenta.
Instantes de pouca opressão,
cumprindo embora um estúpido dever,
desses do corpo, sob o silêncio infecto de Deus
- que talvez fosse aquele puxador
de autoclismo que um dia me ficou na mão,
numa taberna discreta ao Poço dos Negros.
Guardei-o ainda alguns meses, mas de Deus
como de um autoclismo, de tudo
acabamos por nos cansar.
Até de poemas.
São ruas velhas assim, onde paira
a suposição grosseira de um urinol
divino e sombrio, que nos fazem aceitar
esta voraz forma de extermínio. O nosso,
incandescente, num apogeu de melancólicas
retretes onde os insetos e bactérias ao acaso
nos distraem o olhar
embaciado pelo abusa da lixívia.
Uma lucidez pegajosa, toldando a idade
das mãos invariavelmente senis.
Como se bastassem, ou fossem mesmo
excessivas, certas baixas certezas de cão,
desastres menores. Sabendo-se de fonte
segura que o mijo pode ser um poema.
Um poema cansado do que antes foi vinho,
a suicidar-se agora - contente e tão triste
-no vazio evidente de uma louça
branca, amarela, sagrada.
Pequenas alegrias e no entanto as maiores,
essas mesmas que bastarão,
que terão de bastar,no dia
em que formos
morrer.

Capivaras me mordam.

Essa história que aconteceu em Janeiro de 2006, quando antigos amigos arquitetos, que há 20 anos não se viam, conseguiram finalmente se encontrar, e constatar que o tempo e a distância não são obstáculos para uma grande amizade, 15 minutos bastam para esquecer que 20 anos se passaram.

UMA NOITE DE ENCONTROS, CAPIVARAS E URINOIS

Sexta-feira, quase oito da noite, ponte Rio-Niterói, calorão senegalês, duas mulheres falando pelos cotovelos dentro do carro, eu e o meu cupincha Silvio calados...era uma tensão no ar. O telefone toca, meto a mão no bolso para atendê-lo, quase que a traseira de um ônibus nos abençoa. Atendo e do outro lado era o Professor Pasqualette, que com pontualidade britânica já estava no local do encontro.
- Pô meu camarada, bar gay de novo não!!! Esse Palafita's é bar de viado!!! Diz ele indignado.
- Calma que a gente já ta chegando! Digo eu.
- Mas corre que tem uma capivara mordendo a minha bunda!!Desligo e meto o pé no acelerador, afinal o careca nervoso cospe para todo o lado.

É dois real moço. Pago e estaciono. Vejo um buteco na minha frente, e me encaminho para lá. Que bacana, parece o Bar do Dedão em São Gonçalo.
- Calma ô niteroiense capiau. Esse é o bar do mineiro, deixa de ser brega - diz o meu cupincha Silvio.
Andamos mais um pouquinho, e penso:
- Que bom que vim com gente chique, pois estava disposto a parar o carro na saída do Rebouças e procurar o tal Palafita's a pé.Logo avistamos o Careca, que a andava de um lado para o outro coçando aquele campo árido, onde um dia floresceu uma vasta plantação. Falava sozinho e dava para entender:
- Cacete, com tanta birosca boa no Grajaú, esses viadinhos arrumam um lounge (palavrinha viada) longe pacas, e ainda por cima caro pra dedéu!!! Eu queria mesmo é conhecer o Bar do Dedão. Tomara que a próxima reunião seja daqui a mais vinte anos - pensava o mestre.

Com beijinho das mulheres e sacaniações dos homens o mestre se acalmou parcialmente. Mostrou seus discos esquisitos (aqueles rocks decadentes que ele escuta desde os tempos da USU) e perguntou se a gente tinha realmente coragem de entrar naquele antro pederasta. Confiantes em nossa masculinidade, eu e o meu cúmplice Silvio fomos entrando e argüindo por nossa reserva.Pausa para descrever o local. Modernoso, despojado, caro e estiloso. Parece uma mistura entre uma taba de ritual Kaurup com república de estudantes peruanos, decorado pelo Clodovil. Ou seja, lugar ideal para encontro entre homo-inrustidos. O local serve também para se esconder com aquela baranguinha que você quer abater sem ser visto, uma vez que a única iluminação da bifurca é uma vela de macumba dentro de um ralador de queijo. Muderno. Se o Dedão vier aqui, ou surta ou copia – pensei eu.Rapidamente descobrimos a razão da escuridão. O cadáver, oops, cardápio, não podia ser visto pois era realmente para gays ricos, que não se incomodam de pagar zilhões por um coquetelzinho de tomate com salsicha. A minha nega pediu uma batida de manga, quando tomou o primeiro gole cochichou no meu ouvido:– Môo vamos pro Dedão?

O líquido tinha gosto de biotonico Fontoura. A nega do meu capanga Silvio pediu uma batida de coco feita com o mais puro sabão neutral pastoso. A cerveja pelo menos era quentinha e servida em um urinol de ágata (uuuiii). Acho que era para ligar uma coisa com a outra. Ninguém se atreveu a usar o urinol da forma como foi projetado. Falta grave para um grupo de arquitetos. Lembrei-me das aulas de história da arquitetura com a Ângela. Forma e função. Eu pensei até em me atrever a usar, da forma tradicional, a peça que por tantos anos morou debaixo da cama da minha vó, porém fiquei temeroso de ver o meu lindo Zé José ser apreciado e desejado pelos boiolas do lugar. Coisas de Laurindo. Vendo aquele penico reluzente lembrei da história da minha vó, que era portuguesa, e que em uma noite de sexo selvagem com o meu avô gritou:
- Higino, me mata com aquela coisa de fazer pipi.Então vovô meteu a mão debaixo da cama e sapecou uma penicada na cabeça da vovó.

Então, sentiu-se um suspiro de alívio. Chegou o Sergião. Homem culto e da melhor estirpe, nos fez ver que aquela nossa implicância tratava-se apenas de breguice e preconceito arraigados dentro do ser niteroiense/grajauano. Homem sábio e de vasto convívio com as minorias sexuais, sem jamais ter cedido às tentações do canibalismo, Sergião nos ensinou como usar o lugar. Explicou-me que jamais deveríamos colar meleca embaixo da mesa ou coçar as partes baixas. Perguntei se podia fumar unzinho e ele em sua sapiência me iluminou dizendo que unzinho era coisa de favelado. Melhor pedir cannabis. Mais zen impossível. Achei melhor obedecer, afinal é o meu único amigo que tem netos.Repentinamente surge no horizonte duas enormes e esguias criaturas. Edna e Silvio (ou Sivo, ou Sifú já que o pobre convive diariamente com quatro mulheres...tadinho). Respirando o ar rarefeito e esbarrando a cabeça no teto do quiosque, o gigante casal exalava simpatia. Edna cumprimentou a todos com beijinhos, o que me causou torcicolo. O seu esposo mostrou que a convivência com Michael Jackson na câmara hiperbárica enriquecida de oxigênio puro realmente produziu efeitos benéficos em seu organismo. O homem está mais conservado que azeitonas Beira-Alta. Parece o mesmo sujeito que limpou o teto da basílica de São Pedro, onde foi em lua de mel com a divina Edna há 60 anos atrás. Viva eles.

Papo vai, papo vem, e nada de chegar aquele produto especial da Bolívia. Gritei para o garçom;
- Ô Wanderval, cadê o bagulho? – cannabis na língua de Araribóia.O garçom que não era conterrâneo, e não se chamava Wanderval, me lançou um olhar apatetado, e se aproximou perguntando se eu queria outro urinol.
- Meu filho, se der larica serve – respondi.O calor piorava. Comecei a sentir um comichão no baixo ventre, mas não tive a menor coragem de perguntar onde poderia realizar o descarrego. Fiquei com medo de me conduzirem para a área das capivaras, ou ter de fazer ali mesmo no urinol. Toinho convidou o meu cupincha Silvio para ir ao carro escutar Manfred Man, Genesis e Emerson, Lake & Palmer. Se eu não conhecesse os dois diria que o Palafita’s já estava induzindo o amor entre iguais. No mesmo momento a cerveja quente fazia o meu intestino grosso comer o intestino fino. Então...

Surgem no horizonte aqueles maravilhosos olhos verdes. Os mais bonitos que os ursulinos tiveram oportunidade de conhecer. Angélica. Maridão a tira-colo, e acompanhada de uma outra pessoa. Seria a filha? Não a filha é morena. Seria a mãe? Não a mãe não era. Seria a Benedita? Não, era branca e parecia ter um ar de civilização pré-colombiana. Juro que não reconheci, mas era quem eu imaginava. O melhor produto brasileiro exportado para a Bolívia.A mulher diferentemente do que eu achava não chegou metida em uma chompa, muito menos com aqueles típicos gorros coloridos e cobertor estampado nos ombros. Preconceitos e estereótipos são mesmo muito danosos, eu estava certo que ela viria montada em uma lhama. Que nada. Chegou bonita e elegante, marcando presença, vestindo Versace e cheirando Esteé Lauder. Pensei eu cá com os meus botões:
- Essa Mônica deve ser a viúva do Pablo Escobar.Aí, os meus neurônios (poucos), que são mais adestrados que os meus botões, replicaram:
- Deixa de ser toupeira, ô botão. Pablo Escobar é de Medellín, que fica na Colômbia. A moça é a esposa do “capo dei tuti capi” do cartel de Tarija. Em Tarija não se produz cocaína, mas coisa muito pior. O local e mundialmente famoso por produzir e exportar, com a mais alta tecnologia, maridos para as mulheres do Leblon.
- Há bom – respondeu através de sinapses os meus botões – eu achava que Tarija fosse aquele lugar no alto das montanhas perto do lago Xixicoco onde nasceram aqueles caras que assopram canudinhos na Cinelândia.

Voltando à nossa reunião (é melhor largar os botões e os neurônios que não se entendem mesmo), onde estávamos mesmo?...A Mônica. Espetáculo. Vocês viram os pés? Que coisa!!! Pensei na mesma hora arrumar um cargo de bispo para virar pedófilo. O meu acólito Silvio surtou no mesmo instante:
- Caracoles, miercoles muchacho. Nosotros nos quedamos a cá para hablar acerca del desaroio de Monica. Gualpa mui chica e mui ermosa que se cambió para lá ciudad de Tarija e está a pedir una Cueca Cuela caliente!!! Chumpitaz, Melendez, Hojas, Calderón, Aristizabal, Higuita, Baldevieso e Valderrama!! Segura a mulher que a coca cola aqui dá disenteria.

Foram feitas as devidas apresentações. Angélica tal qual Leonardo Da Vince exibiu o seu Davi – homem de sorte – que logo se mostrou um Golias de simpatia. Minha nega Lê falou ao meu ouvido:
- Você não falou que a mulherada estava precisando de uma lanternagem? Tá aprontando comigo? Deixa de ser mentiroso homem, com elas você não sai sozinho de jeito nenhum!!!Não é que é mesmo. Excluído o Sifú, que toma formol, os homens estavam todos carecas e barrigudos. As mulheres entretanto, tirando uma muxiba aqui e alí, ainda davam um caldo de primeira.Iniciou-se então a exibição de fotos dos descendentes. A luz bruxuleante que vinha do ralador de queijo não era ideal, mas deu para ver que os filhos faziam jus aos pais. A Edna exibe sua penca de belas filhas, a Angélica apresenta a sua melhor produção, a Amanda, então a Mônica mostra o que é que a Bolívia tem. Paola. Já o Bernardo estava camuflado. Integrante das forças expedicionárias Bolivianas, o rapaz na foto parecia um mariner pronto para eliminar guerrilheiros das FARC. Os filhos do Sergião, foram bravamente representados por fotos 3x4, mas dava para ver ali o DNA do pai. Bonitos, compridos e mal maquiados (culpa do lambe-lambe). De repente, preocupação geral...Toinho tirou algumas fotos encardidas do bolso fétido. Era conhecido que o nosso grão-mestre tinha gerado duas criaturas...O meu comparsa Silvio virou para mim e disse:
- Já ouvi à boca pequena, que um tem a cara do Ozzy Osborne e o outro é igualzinho ao Lou Reed. Walk on the wild side.
- Melhor que seja assim meu chapa. Já pensou se nascem com a cara do pai? Ou pior com a cara do coelho Bundo?
Mas para alívio geral, os meninos são lindinhos e se parecia mais com os Menudos.

Com a chegada dos últimos amigos, os “assentos” que já eram poucos acabaram, então solicitamos ao Wanderval que fosse providenciado mais “assentos”. Prontamente o rapaz apareceu com um tronco em forma de canoa. Com essa o Davi deu um pulo e declarou:
- Nesta piroga eu não sento! Quem é que deu a idéia desse quiosque?- Foi o Laurindo – responderam simultaneamente Toinho e Angélica.Nesta hora vira a minha nega e pergunta:
- Zan (apelido carinhoso), quem é esse tal de Laurindo? Será que ainda vamos esperar a chegada de mais alguém?
Achei melhor não explicar pois certamente teria problemas conjugais, afinal não sei como reagiria a minha lindinha quando descobrisse que dormiu tantos anos com o sátiro Laurindo.
O episódio da canoa foi a gota para abandonarmos o local, praguejando contra o valor cobrado por uma batida de biotonico Fontoura, outra de sabão neutral pastoso e algumas cervejas Belco quentinhas e servidas no penico de ágata (uuuiii). Alguém deu idéia para irmos à casa do Clodovil reclamar. Mas achamos melhor optar mesmo pelo bar do Mineiro, logo ao lado. Toinho, o mais animado saltou rapidamente e correu na frente:
- Vou lá reservar uns lugares perto do palco – gritou o bardo ao longe.- Vamos lá cambada que o cantor está entoado Travessia. Disse o meu camarada Silvio.
Fomos correndo de um bar para o outro cantando “solto a vó na estrada, já não quero parar...”

Quando chegamos no quiosque do Mineiro, meu espírito se tranqüilizou. Estava em casa. Uma mesa comprida, toalhas xadrez vermelho e branco, paliteiro, bolachas de chope e fio dental. Um cantor berrando Andança – “vim, tanta areia andei, na lua cheia eu sei, uma saudade imensa...” Tudo há ver. O Toinho já tinha feito os pedidos, e antes que alguém tivesse alguma outra idéia, aparece o garçom Helio carregado com porções de carne seca desfiada, aipim frito, torresminho, picanha fatiada, lingüiça mineira frita, farofa e caldinho de feijão. Sensacional. Faltaram apenas os testículos a milanesa. Uma iguaria.
Alegre como um pinto no lixo o rei da lousa declarou:
- Isto é que é bom na vida. Comida que faz merda.Instantaneamente se deu conta que todos olhavam embasbacados para a musa dos Andes, que montava as mesas em inédita configuração. Conclui que nós, pobres descendentes de Macunaíma, não sabíamos absolutamente coisa alguma sobre a cultura bolivariana. Habilidosamente, a pastora das lhamas re-arranjou as mesas em um perfeito quadrado, o que possibilitou todos presentes apreciarem muito bem, as imperfeições estéticas dos outros.

As cervejas vinham, os acepipes também. A conversa fluía e eu emocionado com o encontro roguei uma prece:
Cerveja nossa que esta no bar,
Resistente seja o nosso fígado,
Venha a nós o copo cheio,
Seja feita a nossa noitada,
Assim na rua como na festa,
O drink nosso nos daí hoje,
Perdoai a nossa ressaca,
Assim como nós perdoamos,
A quem não tenha bebido,
E não nos deixei cair no calçadão,
Mas livrai-nos da água
Barmen

Ninguém gostou muito da heresia. Sergião versado e responsável, alertou que a minha sorte era que todos os presente eram agnósticos, pois tal blasfêmia renderia decapitação de algum membro pulsante, no oriente.
Um pouco depois, meu parceiro Silvio sorrateiramente debandou do grupo junto com o mestre Pasqualette e foram em direção do carro. Cedeu ás tentações do pouca telha. Acho que o educador convenceu o pupilo niteroiense escutar um rock decrépito. Jethro Tull ou mesmo Rick Wakeman. Coitado do calvo de Niterói. Foi abduzido pelo canto de sereia do ET do Grajaú. Horas depois apareceram com cara de quem tinham cheirado o sovaco do outro. Cegante.Aparte. A minha nega, depois de séculos de convivência com este arquiteto frustrado já se acostumou com a água de vaso. Porém gostaria de deixar registrado que Luciana, a nega que deu jeito no meu camarada Silvio, enfrentou bravamente as intempéries da noite. Arquiteta de larga competência jamais deixou a peteca cair, mesmo quando tentamos combinar o capitel jônico do Sergião com a abóbada do Toinho. Parabéns pelo achado Silvio.

A noite seguia alegre quando lembramos das ausências de outros queridos amigos. Ficamos todos sorumbáticos, macambúzios e taciturnos. Com certeza a reunião seria abrilhantada com a presença destes.

Meia-noite e nosso guia Toinho resolve se retirar. CDF como sempre, alega que no dia seguinte teria que preparar a palmatória para as aulas de segunda-feira. Tinha também que ensinar uma aluna noções de contabilidade. Coisas sobre balanço, bruto e o líquido. Com a ausência do reitor, todos se sentiram abandonados. As comidas gordurosas principalmente. Contudo, compensamos a falta do professor Raimundo, com altas doses de cerveja.

Depois deste ponto lembro somente que o álcool se apossou da minha criatura. Acho que também tomou conta da mente a Edna, que parecia um personagem de “A volta dos mortos vivos”. Comecei a falar pastoso e a contar mentiras. Amigos, me perdoem pelas fábulas. Eu nunca fui plagiado pelo Niemeyer. A Patricia Poeta não sabe quem eu sou. 40cm é o tamanho do meu fêmur e nunca fui ponta esquerda do Fluminense.

No final da noite, bêbado, louco e rouco, fui tele-transportado até Niterói pela Maquina do Capitão Kirk, mas com toda certeza foi a melhor noite que tive nos últimos anos. Foi inesquecível.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

A revolta dos ácaros

A gente fica mal acostumado quando passa um bom pedaço da vida dormindo acompanhado. Aí, um certo dia, acontece a descompanhia. Você então é acometido de um mal moderno denominado solitariuns solteirus est, aí meu amigo, é um tal de agarrar o travesseiro, de fazer carinho na almofada, procurar a Catherine Zeta-Jones debaixo do cobertor e encontrar simplesmente aquele lençol embolado. Mas, noite passada eu me dei conta que essa solidão não passa de grossa balela.

Depois de muito tempo insone, quando aproveito para escrever aqui neste hospício virtual, na noite passada consegui sem ajuda da velha e sensata maracujina, dormir o meu sono da beleza. Desta vez, nem os meus próprios roncos me despertavam. Que maravilha, roncava, babava e resfolegava sem ninguém para me cutucar.

Pause: cutucar pode ser um problema, mas existe coisa pior do que mulher com o pé gelado, e que te encosta quando você já está dormindo? Juro que me dá medo. Me sinto naquele filme “A mão”, onde a tal mão, decepada, fria, verde e impiedosa persegue e assassina todos os personagens do filme.

Play: Contudo, despertei na alta madrugada. Acendi o abajour, e procurei o som que me libertou dos braços de Morfeu. Não vi nada e apaguei a luz. O cochicho aumentava. Acendi novamente e juro que me lembrei do Gilliard. Aquele cantor que Deus, em sua infinita sabedoria, nos abençoou com o ostracismo.

“A pulga e o percevejo fizeram a combinação.
Fizeram uma serenata debaixo do meu colchão.
Torce e retorce, procuro mas não vejo,
Não sei se era pulga ou se era um percevejo”.

Não era possível! O som vinha do centro da minha cama. Desta vez, além do abajour, contei com o auxílio luxuoso do lustre e de todas as dicróicas que a maldita decoração nos obriga e instalar nos indefectíveis rebaixos de gesso. Peguei uma lupa, meu sobretudo, um cachimbo e um violino, Esquece, essa imagem de Sherlock Holmes não combinava em nada com o meu pijama esmolambado. Mas a lupa tinha. Apurei os ouvidos e escutei claramente:
- Fome, fome, fome!!!
Parecia a Madrugada dos Mortos. Era isso mesmo. O meu colchão devia estar mal alimentado. O seu interior roncava como o estômago de um leão famélico procurando uma presa na escuridão.
- Fome, fome, fome!!!
Pensei em ligar para o Patrus Ananias (aliás nome de parente do Tio Patinhas) do PT e inscrever o meu colchão no Fome Zero. Quem sabe parte das doações que fez a Gisele Bündchen pudessem ser encaminhadas para o meu colchão. Preocupado com a saúde das molas encapsuladas e da espuma densidade 45, eu perguntei a ele, com o respeito que se deve ter a um amigo que você dorme em cima, companheiro de tantos momentos gososos e outros gasosos:
- Amigo Ortobom, o que posso fazer eu para matar essa fome que te consome?
- Ô viado, que porra é essa de Ortobom? Abre o seu olho e mais respeito com sua majestade!
- Ortobom, não sabia eu que você era o rei dos colchões?
- Puta que pariu, pega essa merda desta lupa e olha direito.
Foi aí que consegui vislumbrar de onde vinha o burburinho. Centrei a luz no meio da cama, e lá estava. Perfilados em linhas e colunas, liderados por um general, eles se mostraram. Um exército de ácaros. Pareciam os 300 de Esparta, prontos para enfrentar Xerxes no desfiladeiro das Termópilas. Neste caso Eu.
- Qual a razão de tal animosidade? Perguntei.
- Fome, fome, fome - responderam todos, uníssonos.
- Mas qual a razão para esta fome toda?
Neste momento, um deles, supostamente o líder, se aproximou e se apresentou.
- Amigo Zan. Eu sou Ícaro, o rei dos Ácaros. Aqui estamos há quase 6 anos, e convivíamos gordos, felizes e satisfeitos com esse meio-ambiente que nos foi dado. Aqui nossos filhos cresceram e aprenderam a degustação das peles e sucos naturais provenientes do seu corpo e o da sua companheira. Nos banqueteávamos noite após noite, com as iguarias oriundas do roça-roça. Entretanto, a nossa musa nos abandonou, e levou com elas suas apetitosas peles mortas. Com isso, a nossa ração diária diminuiu pela metade. Você, mais velho e menos saboroso, passou a tomar banhos toda noite e com isso desperdiçar o nosso pão de cada dia. Hoje, temos que nos contentar com os cabelos que se desprendem em quantidades babilônicas de sua cabeça. O problema é que nossa dieta, a base de cabelos, está criando uma revolta no mundo ácaro. Você sabe melhor do que eu, que cabelo no dente só traz problema. Por isso a razão desta revolta.

Eu, pasmo e incrédulo, escutei pacientemente toda a argumentação de Ícaro, afinal, mesmo invisíveis aos meus olhos, aquelas criaturas eram meus fiéis companheiros. Com eles eu dividia o meu leito. Com eles eu dormia toda noite e sonhava com aquela que sempre será o meu sonho. Alguma providência deveria ser tomada. Aquelas criaturinhas comiam os meus restos. E gostavam. Eu era gostoso para alguem, mesmo que fossem ácaros. Eu não poderia deixa-los a míngua.

Então, um impulso incontrolável me levou ao banheiro. Lá, escondida entre os shampoos, condicionadores e cotonetes, estava ela. A salvação do reino ácaro. A pedra-pomes. Agarrei aquela pedra e rapidamente voltei para a cama. Os meus menores amigos tinham que se alimentar. Posicionei-me sobre aquele exército e freneticamente me pus a ralar a sola dos meus pés. O farelo que caia sobre o mundo acariano era como o maná que alimentou os judeus na sua fuga do Egito. Eles se fartaram, recolheram o excesso em farnéis e sumiram nas profundezas do colchão. Me senti feliz e realizado, como um ministro de posse de um cartão corporativo comprando pastel de tapioca para a plebe ignara.
A partir daquele dia, a ralação e esfoliação do meu corpo se tornaram obrigatórias. Tenho muito que agradecer aos meus ácaros pela companhia que eles me proporcionam. Afinal, quem mais se habilita?

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Pedrinha

Escolhi uma pedrinha para abrir este blog. Deve ser coisa de arquiteto. Pedra fundamental. Mas é um início, afinal toda construção é pensada em torno de uma pedra. Até Jesus Cristo falou para Pedro que a igreja dele se iniciaria sobre uma pedra. Deu no que deu. Talvez a razão da escolha desta pedrinha seja também um pouco mística. Não sei onde eu li, vi ou escutei, mas exite uma história que quando é preciso uma mudança no rumo de nossas vidas, a gente deve arrumar uma pedra. Ou melhor a pedra é que deve arrumar a gente. Sem que procuremos por ela um dia ela surgirá na nossa frente. Então, devemos escrever nela o nosso maior desejo e mantê-la sempre perto até que esse desejo se realize. Nunca dei muita importância para essas bobagens, mas, procurando um novo rumo para o meu destino, não é que me apareceu uma pedrinha em cima da minha cama? Não sei como foi parar lá, mas quando dei de cara com ela eu simpatizei com a forma e com a cor. Por via das dúvidas escrevi nela o que espero que a vida me dê. Obviamente não escrevi tudo que gostaria de ter, porque senão essa pedra seria do tamanho do Pão de Açucar. Você pode ver, está escrito nela o meu maior e mais secreto desejo. Não entendeu? Ahá!!! Depois que ele se realizar, eu volto aqui e traduzo o que significa o símbolo. Achou que eu iria entregar o ouro para o bandido logo no primeiro blog. Se voce me conhece, e duvidar, pode pedir que te mostro a pedra, está dentro do meu bolso. Sempre. Acompanhe os próximos capítulos.